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RGB Entrevista com Sônia Wolff



1. Na sua visão, o que é a governança no setor público?


R: De forma genérica, o conceito de governança envolve funções básicas que devem ser desenvolvidas para governar, traz em si processos e princípios a serem seguidos. O processo de governança envolve descobrir meios para identificar metas e, depois, identificar os meios para alcançar essas metas.


O Decreto nº 9.203, de 2017, dispõe sobre a política de governança da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, trazendo conceitos, diretrizes, princípios e mecanismos.


Encontra-se em andamento Peer Review sobre Centro de Governo com a OCDE, que ao final apresentará recomendações para a elaboração de um Plano de Ação para aperfeiçoamento do Centro de Governo brasileiro. Simultaneamente, um grupo de trabalho está estudando os normativos sobre o tema e também acompanhando a citada Peer Review para propor a implementação do Plano de Ação.



2. Quais países podem ser considerados como benchmarking em Governança no setor público hoje?

R: Na minha opinião destacam-se Alemanha, Austrália, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Reino Unido, Suécia e Suíça.



3. Quando e como foi o seu primeiro contato com a Governança no serviço público?


R: Meu primeiro contato com o tema governança no serviço público foi no governo Fernando Henrique, em 1995, quando trabalhei na elaboração do Plano Diretor de Reforma do Estado.



4. Na sua opinião, quais são os principais desafios para a implementação da Governança no setor público?


R: 1) Integração e análise de dados para gerenciamento de riscos e definição da priorização com base em evidências; e 2) Desenvolvimento de qualidade e capacidade institucional.



5. Quais são os principais ganhos para a Governança no Brasil a partir do trabalho realizado para acesso à OCDE?


R: O processo de acessão do Brasil à OCDE é uma oportunidade de o país realizar trocas de experiências e, assim, adotar as melhores práticas internacionais em políticas públicas e ter um alinhamento com os países mais desenvolvidos e com indicadores favoráveis ao crescimento e progresso. Além disso, proporcionará uma maior inserção econômica internacional e melhoria do ambiente de negócios, bem como trará ao Brasil a oportunidade de aprofundar a cooperação e integração regional na América Latina.


Ademais, esse processo é uma sinalização aos investidores de que o país segue as melhores práticas internacionais, uma vez que o Brasil terá um selo de qualidade para investimentos sustentáveis e duradouros. Assim, o país será um dos maiores mercados emergentes a ter governança e legislação econômicas compatíveis com os padrões exigentes da Organização. Alguns dos principais benefícios da entrada do Brasil na OCDE são elencados a seguir:


● Maior atratividade de investimentos internacionais;


● Melhoria do ambiente de negócios;


● Maior confiança dos agentes econômicos;


● Aumento da credibilidade internacional;


● Aceleração das reformas estruturais;


● Abertura comercial;


● Mitigação dos custos de financiamento;


● Aperfeiçoamento das políticas públicas, tendo por consequência maior racionalidade e eficiência;


● Fortalecimento e modernização institucional;


● Oportunidade de discutir melhores práticas de políticas públicas em um contexto multilateral; e


● Maior transparência.



Ao entrar na OCDE, o Brasil poderá desfrutar de posição estratégica privilegiada na arquitetura financeira internacional, pois será o único país a fazer parte simultaneamente da OCDE, dos BRICS e do G20. Esses grupos recorrentemente formulam posições comuns e influenciam o curso da economia global. Portanto, ser membro pleno da OCDE aproximará o Brasil dos debates internacionais, além de poder ter voz e voto nas decisões globais que ali estão sendo discutidas, ampliar a troca de experiências e divulgar políticas públicas brasileiras bem sucedidas.



6. Resumidamente, quais os temas dos instrumentos da OCDE que o Brasil já aderiu ou que está em processo de adesão? E, por outro lado, quais os que ainda devemos avançar para solicitar a adesão?


R: Atualmente a OCDE possui 245 instrumentos legais em vigor, apresentados em cinco categorias, conforme abaixo:



Decisões: instrumentos jurídicos da OCDE que são vinculativos para todos os membros, exceto aqueles que se abstêm no momento da adoção. Embora não sejam tratados internacionais, eles implicam no mesmo tipo de obrigações legais. Os aderentes são obrigados a implementar decisões e devem tomar as medidas necessárias para tal implementação. (Vinculantes)


Acordos Internacionais: instrumentos jurídicos da OCDE negociados e concluídos no âmbito da Organização. Eles são juridicamente vinculativos para as Partes. (Vinculantes)


Recomendações: instrumentos legais da OCDE que não são juridicamente vinculativos, mas conferem a eles uma grande força moral como representação da vontade política dos adeptos. Há uma expectativa de que os aderentes façam o máximo para implementar totalmente uma recomendação. Portanto, os membros que não pretendem fazê-lo geralmente se abstêm quando uma recomendação é adotada, embora isso não seja exigido em termos legais. (Não vinculantes)


Declarações: instrumentos legais da OCDE que são preparados dentro da Organização, geralmente dentro de um órgão subsidiário. Elas geralmente estabelecem princípios gerais ou metas de longo prazo, têm caráter solene e são geralmente adotadas nas reuniões ministeriais do Conselho ou nas comissões da Organização. (Não vinculantes)


Acordos, entendimento e outros: vários instrumentos legais substantivos ad hoc foram desenvolvidos no âmbito da OCDE ao longo do tempo, como o Acordo sobre créditos de exportação com apoio oficial, o Acordo Internacional sobre princípios de transporte marítimo e as recomendações do Comitê de Assistência ao Desenvolvimento (CAD). (Não vinculantes) (OECD, 2020)



Com relação aos instrumentos legais da OCDE, dos 245 instrumentos vigentes, o Brasil já aderiu a 93, e está em processo de adesão a 50 (Figura 2). Os demais instrumentos estão em avaliação ou têm desafios para serem superados.



Figura 1: Situação do Brasil em relação aos instrumentos legais da OCDE (Nov/2020).




Figura 2: Evolução do Brasil com relação a adesão aos instrumentos legais da OCDE (Nov/2020)


Como pode ser percebido na Figura 2, no período de 2018 a 2020, o Brasil aumentou em mais de 200% o número de instrumentos aderidos, passando de 37 instrumentos (número de instrumentos aderidos até 2017) para 93 instrumentos aderidos (número de instrumentos aderidos até nov/2020).


Destaca-se que o Brasil encontra-se em processo de adesão a 50 instrumentos da OCDE, sendo que 36 são da área de meio ambiente. Ademais, está em estágio avançado de adesão aos Códigos de Liberalização de Movimentos de Capital e Operações Correntes Invisíveis (OECD/LEGAL/0001 e OECD/LEGAL/0002). Ao aderir aos Códigos de Liberalização da OCDE, o Brasil melhora sua reputação como um agente global responsável, enquanto desfruta de um melhor acesso aos mercados da OCDE e proteção contra possíveis tratamentos discriminatórios de outros aderentes. Nesse contexto, o Brasil já avançou em diversos aspectos, como a abertura do mercado de aviação, maior abertura do mercado segurador, financeiro, de capitais e serviços.


Cabe ainda destacar ainda o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, um exemplo de êxito dos esforços de convergência às melhores práticas da OCDE pelo Brasil. A agência tem realizado por mais de vinte anos esforços de participação, estudos e convergência de práticas, o que a colocou entre as melhores do mundo.


A adesão a instrumentos representa a convergência dos normativos e das políticas públicas brasileiras aos padrões recomendados pela OCDE, promovendo o aprimoramento das instituições e regulações em favor da produtividade e do crescimento sustentável, bem como da transparência e eficiência das políticas públicas.


Ademais, a OCDE oferece ampla gama de estatísticas de indicadores e estudos comparados, que possibilitam aos países adotar uma estratégia de ações para aprimorar sua performance. É o caso, por exemplo, do indicador PMR (Product Market Regulation) elaborado pela OCDE e que mede a eficiência regulatória desde transportes até serviços. O governo brasileiro vem realizando estudos na busca de oportunidades de reformas que levem à melhoria do arcabouço regulatório, diminuindo burocracias, aumentando eficiência e a segurança jurídica, melhorando assim o ambiente de negócios e atraindo mais investimentos.




7. Na sua opinião, como a Rede Governança Brasil contribuiu para os trabalhos relacionados com o pleito de acessão junto à OCDE?


R: Em suma, o Tribunal de Contas da União já apontava, desde 2017, o caminho rumo à OCDE como importante estratégia a ser seguida em direção à melhoria da governança pública. Por sua vez, a Rede Governança Brasil contribuiu para os trabalhos relacionados com o pleito de acessão junto à OCDE, oferecendo espaço qualificado para debates de questões importantes para o desenvolvimento do país e possibilitando o engajamento de importantes atores para o alcance destes objetivos.


A Rede Governança Brasil é um espaço que reúne especialistas voluntários permitindo a disseminação de boas práticas e debate extremamente qualificado, contribuindo muito para o alcance do pleito de acessão do Brasil à OCDE.



8. E, como que os resultados dos trabalhos da Cooperação Brasil e OCDE podem contribuir para as atividades desenvolvidas nos comitês na Rede Governança Brasil, em especial os relacionados com as Estatais, os Municípios, os Riscos e as Boas Práticas em governança?


R: A OCDE possui mais de 200 fóruns de discussão, tratando das mais diversas temáticas de políticas públicas. O Brasil é o país não membro que possui a maior participação nos Comitês e Grupos de Trabalho da OCDE.


Atualmente, o Brasil é membro associado de 14 fóruns da OCDE e membro participante de 25 fóruns da Organização.


Como membro associado, o Brasil possui direitos e deveres semelhantes aos dos membros plenos, em foros afetos ao combate ao suborno internacional, à cooperação tributária e à avaliação internacional de estudantes, por exemplo. Como membro participante, o Brasil não pode participar apenas das reuniões confidenciais (equivalente a observador regular) em comitês como governança pública, comércio, estatística, agricultura, investimento, defesa do consumidor e governança corporativa.


Como o Brasil é considerado um Parceiro Chave da Organização, é possível a participação na modalidade de “convidado” em todos os fóruns da OCDE.


A participação e engajamento nos fóruns da OCDE proporciona ao Brasil a troca de experiências com os demais países da Organização, além de ser uma oportunidade de o Brasil influenciar nas decisões, bem como apresentar as boas práticas desenvolvidas no país. Destaca-se que, além da participação em reuniões, o Brasil também tem participado de estudos da OCDE e das discussões sobre revisões e criação de novos instrumentos.


A RGB poderá incentivar a participação dos órgãos da administração de todas as esferas de governo nos fóruns da OCDE.



9. Estamos vivendo hoje uma grave pandemia mundial. Na sua visão, quais consequências a atual crise deverá trazer para o setor público brasileiro?


R: A principal consequência é a queda da economia, com reflexo no mercado de trabalho e renda da população, retração de investimentos na economia e redução da rentabilidade das empresas. Esse cenário requer ações rápidas de recuperação pelo governo. A OCDE pode ser um caminho para ampliar investimento externo, especialmente no momento atual, em que os juros estão baixos em boa parte dos países e o mundo está banhado em liquidez.



10. Na sua visão, quais serão os principais desafios para o setor público brasileiro em 2021?


R: Estabelecimento de prioridades de governo; consolidação fiscal; geração de empregos; fortalecimento dos programas de transferência de renda; reforma administrativa; reforma tributária; transformação digital do governo; integridade no exercício da função pública; governança multinível; coordenação entre os poderes; e retomada do crescimento.



Sônia Wolff ocupa atualmente o cargo de Assessora Técnica da Secretaria de Relacionamento Externo da Casa Civil da Presidência da República. É graduada em Serviço Social pela Universidade de Brasília, em Direito pelo Centro Universitário de Brasília e em Pedagogia. É pós-graduada em direito público pela Faculdade Cândido Mendes e em Saúde Pública pela UnB. Teve experiência profissional no Ministério do Planejamento. Orçamento e Gestão onde ocupou o cargo de Chefe de Divisão de Aplicação de Decisões Judiciais.

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